R E L A T O S D E U M O R Á C U L O
“Um passo à frente e você não está mais no mesmo lugar!”
Chico Science
Sábado à tarde no Largo do Paissandu, no centro de São Paulo, próximo ao imponente Teatro Municipal, início de janeiro de 2006. Uma trupe monta seu cenário, veste o figurino, forma um tablado e recebe o público transeunte. Mais do que uma platéia, testemunhas, convidados, companheiros e confidentes de palco."Ô raio o sol suspende a lua! Olha o teatro no meio da rua. Uma roda aqui, uma risada lá, se liga minha gente, é o teatro popular".
Eis o teatro de rua. Impressões compartilhadas in loco, na cumplicidade da troca de olhares, de gestos diretos. A cidade mantém sua coreografia frenética. Ônibus partem, chegam, saem para outras vias. Passageiros, pedestres, vendedores ambulantes, o burburinho das pessoas num ir e vir constante. Agora o mosaico de sons ganha mais um ingrediente:
Mãezinha anuncia para os quatro ventos numa certeza messiânica: " Aqui temos as curas para todos os males!" Sua farmácia ambulante chega repleta de ervas, mandingas, patuás, composições de fórmulas mirabolantes. E rimos de suas promessas, pois a farsa faz parte do contrato.
Maria vende doce e seduz clientes com uma receita peculiar. A fome de Resmelengo será eliminada à base de um prato da culinária baiana. "O que tapa buraco é barro, o que enche bucho é cuscuz". Uma senhora, por volta de seus 60 anos, gargalha compulsivamente e depois confessa: "Meu fiho morreu há uma semana e eu estou aqui rindo de tudo isso" e torna a gargalhar. Ela foi fisgada pela comédia da trupe. O teatro de rua torna-se uma boa maneira para exorcizar os males e as contradições do comportamento humano.
Resmelengo sai de seu estado inerte, por hora parecia sofrer de algum mal súbito, e passa agir na surdina. Seus métodos brejeiros é um retrato instantâneo da brasileirice. O espectador identifica-se com seu jeitinho dissimulado. Um casal improvisa um assento de plástico no chão para assistir o espetáculo. As crianças riem das travessuras dos personagens.
O público já faz parte da cena. Com a cidade ao fundo como cenário da trupe. "Resmelengo quando come, até fica feliz. Chicão é valetão e põe ordem no país". Pronto! O policial Chicão chega para manter a ordem e os bons costumes. Seu cacetete entra na roda e distribui "carinhos" a todos, afinal, um tapinha do GOE não dói.
"O Cuzcuz Fedegoso" já foi servido na Grande São Paulo, Campinas, I Festival de Rua de São Sebastião, no II Fetival de Teatro de Recife, em Pernambuco, mas principalmente na periferia de São Paulo. O Buraco d`Oráculo brinca, canta, dança e encanta. E durante os 50 minutos de espetáculo o público é transportado para um mundo em que a comédia o faz refletir sobre sua realidade. Como disse Chico Science na música Etnia: " É o povo na arte / é a arte no povo / e não o povo na arte / de quem faz arte com o povo".
Fabiano Nunes
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